sábado, 11 de setembro de 2010

Memórias



Tenho uma vaga lembrança de onde foi tirada essa foto. Certamente nas vizinhanças do primeiro bairro onde morei. Talvez perto do convento. Maravilhoso convento, ao lado da igreja que frequentava. Madre Amância, que veio da Espanha, e me deu uma latinha em forma de casinha. Não sei onde foi parar. Uma pena. Adoro latinhas. Será que é por isso? Claro que não é qualquer uma. Aquelas, que imitam casinhas, por exemplo. Era assim, a minha. Deve ter vindo da terra dela, e sumiu no tempo, nem sei porquê, pois não somos de jogar coisas fora - a família aqui é do tipo "colecionadora". E coloco a palavra entre aspas porque não sendo ricos, isso só poderia significar que guardávamos bugingangas. Vide definição do blog (se é que eu ainda não mudei - ando muito errática na minha escrita). 


Sempre se falou muito mal dos colégios católicos (não estudei em nenhum), a Inquisição foi um horror, as Cruzadas fizeram seus estragos, como toda guerra religiosa (e todo fundamentalismo), os missionários saíram aculturando a torto e a direito, e ainda temos a pedofilia na ordem do dia, fora outros dogmas discutíveis. Mas eu, pessoalmente, tirando as crenças que não professo mais, há muito tempo, tenho lembranças adoráveis dessas pessoas: madre Amância, irmã Irene, a noviça Piedade e o padre Alberto, que me batizou e com quem fiz a primeira comunhão. 


Eles eram megafofos, de uma bondade ímpar. E a madre me adorava, acho que ela pensava que eu era uma boneca... eu era muito pequena, muito magra, sei lá, algo assim. Eu e meu irmão éramos muito educadinhos, comportados, estudiosos. Devia ser isso. Sei que fui premiada com essa latinha. E não é que anos depois, quando meu irmão já viajava a trabalho, foi encontrar a irmã Irene em Santos? Eu gostaria de ter reencontrado todos eles, ou qualquer um deles. Não é um daqueles casos de retocar a memória - a gente adora tirar fotografias, faz pose, escolhe o cenário, tudo para registrar um momento - nessa foto que selecionei estou com uma de minhas primeiras bonecas, que chamei de Valéria. O cabelo dela era louro, o vestido era branco e azul. Meu vestido era azul, acho, talvez amarelinho, e costurado por minha mãe, com detalhes na barra. Eu devia estar ali com uns 6 anos, talvez. Papai tirava essas fotos com uma câmera maravilhosa, acho que era uma Roleiflex, e outro dia perguntei ao meu irmão o que tinha acontecido com ela, porque era uma preciosidade, daquelas de se colocar na cristaleira (onde boto tudo que é diferente, bizarro, minhas lembranças de viagem, meus bric-a-bracs), e fiquei triste de saber que ele tinha perdido em uma viagem. Mas, fazer o quê? A vida é assim. Tudo é efêmero. E não é uma fotografia mesmo, é um daqueles micro-negativos que fica num trequinho de plástico, que a gente olha por um visorzinho. Não sei como se chama e não sei explicar direito. Daí que eu peguei e mandei fazer a foto. Fica assim, com esse jeitinho sépia, antiguinho. Porque é. Ufa, bota antigo nisso. Quer dizer, mais do que eu gostaria, não de 1920, 1940, claro, pera lá.


Mas lá estou eu, contente da vida, não estou sorrindo pra câmera só por obrigação - aquele era um tempo de inocência. Eu amava minhas bonecas, enfileirava todas elas na parede do lado de fora da casa e ficava dando aula pra elas. Tinha a Gina (que eu tenho até hoje - tenho urgente de achar um Hospital de Bonecas pra coitadinha, ela é linda, tem cara de antiguidade, só não dá pra por na cristaleira, é grande demais pra isso... só que meus filhos ficam dizendo que ela parece o Chuck, eles são tão malvados! =/) - nome também inventado -, tinha a Jaqueline mãe e a Jaqueline filha (nossa, que cabelos feios, sabe aquele produtinho que se usava antigamente, chamado laquê, nos filmes americanos? poizé... as bichinhas tinham o cabelo armado assim, parecia um capacete, feito o cabelo da mulher do Bonner, esqueci o nome dela...), depois veio a Mary Poppins... e esqueci as outras. 


Coisa de quem brincava sozinha. Coisa de mãe que não deixava a gente brincar com mais ninguém.

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